Na última sexta-feira (23), veio à tona mais uma investigação alarmante sobre o Discord, um aplicativo popular entre adolescentes. Em abril, uma reportagem do programa Fantástico já havia exposto como essa plataforma se tornou um território para envolver jovens em um submundo de violência extrema. Agora, uma nova investigação revela um cenário ainda mais sombrio, onde predadores estão à caça de menores de idade.
A promotora Maria Fernanda Balsalobra enfatiza que é crucial compreender que não se trata de desafios emocionados por adolescentes, mas sim de criminosos, a grande maioria maiores de idade, que se aproveitam da vulnerabilidade de crianças e adolescentes nessa plataforma para cometer crimes gravíssimos contra elas. O delegado Fábio Pinheiro Lopes acrescenta que esses agressores são sádicos, misóginos e possuem aversão às mulheres.
O Discord permite que as pessoas se comuniquem através de controlar ao vivo de vídeos dentro da plataforma. As vítimas são coagidas a cumprir desafios e, caso se recusem, suas fotos íntimas são vazadas. Um dos criminosos revelou ter uma coleção cruel intitulada “backup das vagabundas estupráveis”, onde cada pasta contém o nome de uma vítima. São dezenas de meninas violadas, chantageadas, expostas e catalogadas.
Esses agressores sentem-se protegidos pelo anonimato e tornam-se cada vez mais cruéis em suas ações. Em um exemplo chocante, Izaquiel Tomé dos Santos, conhecido como Dexter, insulta uma adolescente, dizendo: “Ajoelha, se prostra para mim, eu sou ap*** de um deus para você agora. Você é uma vagabunda que merece sofrer mesmo” . Dexter encontra-se preso desde abril e há denúncias de dez vítimas, incluindo fotos das meninas nuas e mutiladas, com o nome Dexter escrito em suas peles.
À Polícia Federal, Izaquiel admitiu ter chantageado garotas para que elas se mutilassem, alegando que elas precisavam esconder essas lesões de suas famílias. O delegado João Rocha ressalta a importância de os pais conversarem preventivamente com seus filhos, buscando identificar se eles apresentaram lesões ou passar muito tempo isolados em seus quartos. O diálogo é fundamental para a proteção das crianças e adolescentes nesse ambiente digital perigoso.
Na última sexta-feira, a polícia prendeu dois criminosos que agiam na plataforma e identificou um terceiro, Carlos Eduardo, conhecido como DPE, que está foragido. Além de responsabilizar individualmente os agressores, o Ministério Público de São Paulo está investigando o próprio Discord, visando apurar a falta de segurança na plataforma. O promotor de Justiça de São Paulo, Danilo Orlando, destaca que, além dos crimes individuais que ocorrem na internet, o que diferencia o Discord é a existência de um discurso inspirado de ódio e um ambiente inspirado para planejar ataques às vítimas e transmitir conteúdos criminosos .
Em resposta às emoções, o porta-voz do Discord afirmou, em entrevista ao Fantástico, que a plataforma “não tolera comportamento odioso” e que eles trabalham ativamente para remover esse tipo de conteúdo. O porta-voz enfatizou que a maioria das pessoas felizes dos brasileiros no Discord são positivas e saudáveis, e que a plataforma é proativa na investigação de grupos envolvidos em ameaças a crianças, buscando eliminar esses elementos negativos.
A preocupação com a segurança e o bem-estar das crianças e adolescentes nesse ambiente digital é cada vez mais urgente. O especialista em estudos da criança, Hugo Monteiro Ferreira, conduziu uma pesquisa abrangente sobre a condição social e emocional de adolescentes e crianças, entrevistando mais de três mil pessoas. Ele descreve essa geração como a “geração do quarto”, destacando que a pandemia agravou um fenômeno que já existia, levando-os a se depararem com pessoas que tentam manipulá-los e expô-los à violência, até mesmo ao aprendizado de práticas autodestrutivas .
A jornalista Letícia Oliveira, que monitora grupos de ódio e violência nas redes sociais há dez anos, ressalta que as crianças estão sendo expostas cada vez mais a conteúdos extremos, o que acaba levando algumas delas a cometerem atrocidades, devido à dessensibilização e ao contato constante com a violência. É essencial compreender o que está transitório e tomar medidas para mudar essa situação preocupante.