Cerca de um quarto dos jovens brasileiros com idades entre 18 e 24 anos afirmam ter experimentado cigarro eletrônico, representando um aumento de 20% em relação ao ano anterior.
Essa é a maior prevalência entre todas as faixas etárias.
Esses dados foram obtidos a partir de uma pesquisa nacional por telefone chamada Covitel, que entrevistou 9.000 brasileiros sobre questões de saúde e hábitos saudáveis.
De acordo com o levantamento, quase 24% dos jovens entrevistados relataram já ter experimentado cigarro eletrônico, fazendo uso diário ou ocasional do produto.
Em 2022, esse número era de 19,7%.
No contexto da população brasileira em geral, incluindo pessoas com idades entre 18 e 24 anos, a prevalência foi de 8%, totalizando 4 milhões de pessoas.
A proporção de jovens usando cigarro eletrônico é semelhante à do narguilé. Enquanto 22% dos jovens afirmaram ter experimentado esse tipo de dispositivo, o índice foi de 8% para toda a população consultada na pesquisa.
No caso de tabagismo convencional, como cigarros e charutos, a porcentagem foi um pouco menor entre os jovens.
Cerca de 9% deles afirmaram ser usuários ou já terem experimentado esses produtos.
Para toda a população entrevistada, o índice foi de 11%.
A pesquisa também revelou que 43% das pessoas que já experimentaram cigarro eletrônico adquiriram o produto em lojas, quiosques e bares, enquanto outros 30% o compraram pela internet.
O estudo também abordou o consumo de álcool. A principal incidência entre os jovens foi observada no consumo abusivo de bebidas alcoólicas, definido como a ingestão de quatro doses em uma única ocasião para mulheres ou cinco doses para homens.
No total, 34% dos jovens de 18 a 24 anos relataram o consumo de álcool dessa forma.
Na população em geral, sem estratificação por idade, a prevalência foi de 24%.
O uso de cigarros eletrônicos, principalmente entre os mais jovens, não é desconhecido por especialistas, embora essa tenha sido a primeira vez que uma pesquisa nacional, representativa de todo o país, tenha medido esse uso.
“Já observávamos isso nas ruas, nos bares e sabíamos que era uma tendência crescente, mas foi o Covitel que identificou o quão grave é a situação atualmente”, afirma Pedro Hallal, professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e um dos coordenadores do estudo.
Segundo ele, ao contrário de outros fatores de risco para doenças crônicas que tiveram um aumento associado à pandemia de Covid-19, o aumento do uso de cigarros eletrônicos entre os jovens não está relacionado à crise sanitária.
“O tabagismo vinha em uma curva descendente sustentável ao longo de décadas. Com a dificuldade da indústria em conquistar novos mercados, eles precisaram criar uma novidade.
E eles criaram. Isso não é culpa da pandemia, é culpa da indústria do tabaco.”
Jaqueline Scholz, diretora do programa de tratamento do tabagismo do Instituto do Coração (InCor) e que não participou do Covitel, afirma que as empresas produtoras direcionam esses dispositivos para as faixas etárias mais jovens. “O produto foi feito para eles.”
Apesar de esses dispositivos de tabaco serem consumidos no Brasil, isso não deveria ocorrer devido à falta de autorização.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) produziu um relatório em junho de 2022, analisando diversas evidências sobre o uso de cigarros eletrônicos. Com base nisso, a instituição optou por manter a proibição.
Empresas da indústria do tabaco costumam argumentar que a falta de regulamentação dos cigarros eletrônicos no Brasil não inibe o consumo desses produtos e expõe a população a mercadorias ilegais.
Elas também citam países que adotaram esses dispositivos como estratégias de saúde pública na tentativa de reduzir os riscos associados a outros produtos de tabaco, como o cigarro convencional.
Algumas das evidências apresentadas no relatório da Anvisa indicam que o cigarro eletrônico pode causar dependência, assim como ocorre com produtos de tabaco comuns.
Câncer, complicações cardiovasculares e uma inflamação pulmonar associada aos cigarros eletrônicos, chamada de Evali, também são problemas relacionados ao uso desse produto.
Por outro lado, há o argumento de que esses dispositivos poderiam substituir o cigarro convencional e reduzir os danos entre os fumantes.
Essa lógica é adotada pelo NHS, o serviço de saúde do Reino Unido, que considera os modelos eletrônicos como uma das opções para quem deseja parar de fumar o cigarro tradicional.
O país europeu também conduz revisões de dados há alguns anos sobre o uso do cigarro eletrônico.
No relatório mais recente, de 2022, constatou-se que existem evidências de que o modelo eletrônico leva a uma redução no uso de cigarros tradicionais entre os fumantes.
No entanto, o assunto ainda é objeto de debate.
Um estudo realizado por pesquisadores do Instituto Nacional do Câncer (Inca) analisou 22 artigos publicados anteriormente e concluiu que o “cigarro eletrônico aumentou em quase três vezes e meia o risco de experimentação de cigarro convencional”.
Scholz também não vê o produto como uma forma de redução de danos. “Se alguém quer reduzir os danos, a melhor opção é parar de fumar”, resume.
Alessandra Diehl, presidente da Associação Brasileira de Estudo do Álcool e outras Drogas (Abead), também enfatiza os riscos já conhecidos associados ao uso desse produto.
Para ela, é necessário melhorar a fiscalização para que a proibição desses produtos seja efetiva no país.
“Quanto maior o acesso a determinada substância, maior é o consumo”, afirma Diehl, que assina a pesquisa do Covitel.
Ela também ressalta que o uso de narguilé representa riscos para os usuários.
Além de causar problemas de saúde, como já ocorre com os cigarros, o narguilé é normalmente compartilhado entre várias pessoas, o que pode levar à transmissão de doenças pela boca entre os usuários que dividem o mesmo dispositivo.